quinta-feira, 2 de abril de 2009

Os Quadrinhos, as Histórias em Quadrinhos, a Arte Seqüencial, as Graphic Novels, as Novelas Gráficas, a Literatura de Imagem, a HQ e as HQs – Parte I

Já há algum tempo, tenho observado algumas mudanças em termos da utilização das ferramentas narrativas típicas da linguagem dos quadrinhos, e também em algumas alterações de tratamento conceitual de seus personagens... São conjecturas nerdísticas até certo ponto... mas fiquei pensando em como as adaptações cinematográficas podem interferir na linguagem dos quadrinhos e na maneira como o gênero dos super-heróis nos quadrinhos, por exemplo, foi afetado por estas adaptações.

Minhas opiniões, é claro, não representam a verdade, mesmo assim queria expor algumas destas ideias. Fica calmo, que sou meio confuso e pode demorar pra você entender aonde quero chegar...

Vamos lá...

Quando falamos destas adaptações cinematográficas, incluímos também as críticas e cobranças a respeito da fidelidade aos materiais originais. A princípio, adaptações deveriam ser apenas transposições de um mesmo gênero, conceito, espírito, estética, mitologia, de uma mídia para outra. É obvio que as HQs têm suas ferramentas e sistemas de métrica, de vocabulário de narrativa, sua estética particular para contar histórias, assim como o cinema tem as suas. E nas adaptações cada mídia usa seus próprios sistemas para transpor estas mesmas histórias, mantendo seus gêneros e conceitos. Também sabemos que a linguagem do cinema influenciou a dos quadrinhos, e vice-versa.

Há alguns anos, adaptações de Histórias em Quadrinhos para o cinema, principalmente no gênero super-herói, eram vítimas de uma só preocupação e talvez dificuldade: os roteiros deveriam ter certos limites de extrapolação da fantasia. Não existia ainda a tecnologia necessária para transpor com “realismo” para a telona os cenários fantasiosos, os superpoderes e as façanhas de heróis e super-heróis, o impacto visual de toda aquelas batalhas grandiosas que vemos nos gêneros explorados nesta literatura de imagem. Hoje em dia, isso não é mais problema... Você consegue fazer tudo, depende apenas do tamanho do seu bolso. Homem-Aranha, Homem-de-Ferro, Batman, Superman... Diretores que cresceram influenciados por obras de quadrinhos aprenderam a usar esta tecnologia e, conquistando resultados financeiros de lucros absurdos, principalmente para os grandes estúdios, fizeram Hollywood ajoelhar-se perante um dos gêneros mais dinâmicos das HQs.

A maioria destes diretores teve como diretriz principal trazer os super-heróis para o mundo real... E, para torná-los verossímeis, alguns elementos gráficos e estéticos de narrativa típicos dos quadrinhos foram, aos poucos, postos de lado.

Realismo. Esta é a palavra-chave de todo o pensamento que estou tentando expor.

Um dos obstáculos gráficos mais engraçados existentes no gênero super-heróis que deve ser “eliminado” para se atingir esse “realismo” são os uniformes originais. Nos quadrinhos, conseguimos aceitar um Wolverine baixinho e peludo, com sua roupa colante amarela e azul, e sua máscara estilo Batman, mas achamos que ela nunca ficará realista vestindo um ator adulto. Se este elemento gráfico for respeitado, o público geral não conseguiria levar tudo aquilo a sério. Assim, o realismo dita as regras para se adaptar a uma estética... seja ela narrativa ou gráfica. Quando idealizaram esses uniformes, os desenhistas estavam interessados em seu efeito gráfico e não em como ele ficaria vestindo um cara de verdade. A linguagem dos quadrinhos é essencialmente gráfica. Assim, estes uniformes são como logotipos.

O uniforme não é o único elemento estético do gênero super-herói alterado em suas adaptações para se atingir esta intenção de verossimilhança junto ao público geral. E não estou falando em coisas “óbvias”, adaptar a linguagem de quadrinhos para cinema é muito mais do que usar crashs, booms ou recordatórios com o texto “enquanto isso...” nas telas de cinema ou TV.

Alguns poucos diretores tentaram transpor as ferramentas narrativas e os elementos gráficos típicos dos quadrinhos para a telona na tentativa de adaptar não só personagens, mas a linguagem das HQs de uma mídia para a outra. Desde a famosa série de TV de Batman na década de 1960 (os planos e composições de cena típicos do que víamos nas revistas do Batman da época; os tipos de cortes de cena; as perspectivas distorcidas quando os vilões apareciam), passando por Dick Tracy – 1990 - (também com os planos e composições de cena vistos nos quadrinhos; a maquiagem pesada tentando reproduzir o estilo gráfico do desenhista Chester Gold; a direção de arte dos cenários simples e limpos; as cores chapadas e sua cartela básicas de tons – imitando a pequena diversidade de cores acessíveis aos meios gráficos da época em que as tiras de Dick Tracy foram publicadas); Sin City (acusado por alguns de ser uma transposição literal demais, mas que trabalha muito bem cada composição de cena e o controle de cortes de cena em termos da sequencialidade típica dos quadrinhos), até o Hulk, de Ang Lee (que a maioria do público odeia, mas que trabalha bem com as alterações de formato de quadros dentro do espaço físico fixo de uma tela de cinema, tentando reproduzir a importância de formatos de quadros diferentes que tem nos quadrinhos, em termos de composição, clima, timing, cortes e intenção de cena; o estabelecimento de quadros de inserção com narrativas paralelas e simultâneas; entre muitas outras reproduções de linguagem).

As ferramentas de narrativa e a estética gráfica das Histórias em Quadrinhos são os principais elementos que diferenciam esta de outras mídias. Sabemos que alguns diretores conceituados, menos envergonhados em admitir a troca de figurinhas entre quadrinhos e cinema (como Akira Kurosawa, Federico Fellini e Orson Wells, por exemplo), usaram em seus filmes as melhores ferramentas de estética e narrativa encontradas em uma boa História em Quadrinhos. O importante é saber separar as coisas e entender melhor o que se quer dizer quando se fala em transpor a linguagem dos quadrinhos para o cinema... Não estou falando de transpor apenas os conceitos de universos e personagens, estou falando de transpor linguagem.

Parte I - As Histórias em Quadrinhos, a Arte Seqüencial, as Graphic Novels e a Literatura de Imagem

Parte II - As Histórias em Quadrinhos, a Arte Seqüencial, as Graphic Novels e a Literatura de Imagem

Parte III - As Histórias em Quadrinhos, a Arte Seqüencial, as Graphic Novels e a Literatura de Imagem

Parte IV - As Histórias em Quadrinhos, a Arte Seqüencial, as Graphic Novels e a Literatura de Imagem

Parte V - As Histórias em Quadrinhos, a Arte Seqüencial, as Graphic Novels e a Literatura de Imagem

Parte VI - As Histórias em Quadrinhos, a Arte Seqüencial, as Graphic Novels e a Literatura de Imagem

MARCELO CAMPOS

5 comentários:

  1. Legal, Marcelo.

    Está bem claro seu raciocínio.
    Vou aguardar a parte dois. : )

    Abs!

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  2. Rafael Pereira1:43 PM

    Gostei muito do seu raciocínio marcelo.
    Já havia percebido essa tendendencia a um tempo atrás, quando muito se falou de um desenhista que fazia planetary e desenhou os X-men também, John Cassaday. Muita gente começou a gostar muito dele, não é atoa que isso aconteceu quando os filmes do x men tavam bambando. Ainda assim as pessoas se prendiam muito a forma , no caso, influenciadas pelo realismo do cinema procuravam um realismo nas historias também. Na verdade poucas adaptaçoes, vide essas que você citou, podem ser consideradas as mais fieis, ou mais adequadas. Acredito que daqui pra frente muito do que estamos vendo em relaçao a narrativa deve mudar, mas creio também que o quadrinho e um meio com caracteristicas proprias demais, e o grande diferencial das adptaçoes daqui pra frente sera como elas lidam ao levar alguns pontos tão particulares da nona arte pras telas.

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  3. Fábio Dantas5:38 PM

    Que hilário, algumas alunas minhas copiaram o texto, me entregando como se fosse delas.

    ZERO!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!

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